terça-feira, 18 de junho de 2013

Ao lado da notícia

17 de junho de 2013.
Guardem bem esta data, pois este dia, como os que virão, estará na história.



                                                                                                                                                                                      Foto: facebook 


Na semana anterior o Brasil parou para acompanhar as manifestações no Rio de Janeiro e, principalmente, em São Paulo. Nas ruas, milhares de militantes e centenas de policiais compartilhando um sentimento único, e momentos de alegria, empolgação, luta, desespero, injustiça e brutalidade.

A ação da polícia no protesto de São Paulo não chocou somente o país. Não digo que foi apenas por conta do conflito, mas a ação dos novos jovens guerrilheiros fez com que os olhos do mundo se voltassem para nós, do Brasil. Se tal fato é bom, veremos com o tempo, entretanto, é impossível negar que a onda de protestos no principal estado do Sudeste despertou uma revolta repentina nos brasileiros, sejam eles crianças, jovens, adultos ou idosos.

No primeiro final de semana após o memorável protesto em São Paulo, foi agendado um ato para o Espírito Santo, na nossa agenda global: o facebook. O número de confirmados no grande evento se multiplicava a todo instante, até ultrapassar os 18 mil. Nas redes sociais foi o assunto do momento: #ogiganteacordou #vemprarua #protestoes .

Enfim, o grande dia!

Às 19h eu saí da redação rumo à manifestação, que já havia começado, com uma equipe da TV – sendo que já havia outras cobrindo o protesto. Fomos em 5: o cinegrafista, seu auxiliar, um repórter, uma estagiária, e eu (que estou começando a atuar como repórter).

Manifestantes ao vivo, no JTVV/ Record
Quando chegamos, os manifestantes estavam em frente ao Shopping Boulevard, na praia do canto. Ali, vi vários militantes cumprimentando policiais que estavam acompanhando o ato. O barulho era muito alto, muitas pessoas gritando, cantando e conversando. Como estávamos com uma câmera e identificados como imprensa, rapidamente os jovens se aglomeraram em nossa volta pedindo para filma-los. Todos estavam muito preocupados com o que iria sair nos jornais no dia seguinte.

Precisamos cortar caminho para chegar na praça do pedágio antes dos manifestantes, para fazer boas imagens. Conseguimos. Uma equipe nossa já estava posicionada para entrar ao vivo, no momento em que os manifestantes chegassem à terceira ponte. O link foi invadido pelos militantes, que gritavam: “fora globo”, “globo mentirosa”, além de palavrões.

Porém, neste momento uma surpresa: os manifestantes não pararam na praça do pedágio. Logo se viu um mar de gente dominando a terceira ponte. Conversamos entre nós, e decidimos que íamos acompanha-los durante o trajeto.

Parte da equipe, em cima da Terceira Ponte
Quando passei das cancelas senti um frio na barriga. Eu temia por uma ação da polícia ali em cima. Mas continuei a caminhada. Durante o trajeto os manifestantes pararam de cantar. O tempo se dividia em um silêncio estranho, e conversas paralelas. Em alguns momentos ouvíamos insultos, por sermos da imprensa. Apesar disso eu sentia algo inexplicável. Enquanto observava a altura e a paisagem, o vento que passava entre os militantes era surreal, eram ventos de paz. Durante os passos pequenos e cansados, passei a observar as pessoas em minha volta. Deparei-me com muitos sorrisos. Ali, todo mundo era amigo, todo mundo era igual.

Quando chegamos à metade da ponte, uma menina bastante assuntada nos alertou que a ponte estava balançando e que poderia quebrar (sim. Ela disse isso). Ela então apontou para o lado mostrando a estrutura, e percebemos que realmente estava balançando muito. Ignoramos, por acharmos aquilo comum – e é. Começamos a nos desequilibrar com o embalo da terceira grande ponte. Foi um tanto quanto divertido mas, confesso: senti um pouco de medo.

Chegando ao final da ponte, o carro de reportagem estava nos esperando. Tínhamos que correr para pegar os manifestantes chegando à casa do governador. Além disso, já sabíamos que o Batalhão de Missões Especiais já aguardava o protesto chegar, um pouco antes da casa do Renato Casagrande. Era certo que eles não deixariam os manifestantes fossem até lá.

Quando chegamos à rua da casa do Governador já havia muitos manifestantes por lá. Fomos caminhando, com um pouco de dificuldade, até o início. Nós da imprensa ficamos encurralados entre os manifestantes e os escudos da polícia. Ali, já sentia que algo estava errado. Havia muitos manifestantes revoltados e nervosos. Algumas pessoas tentavam acalma-los, mas era muito difícil. Foi chegando mais gente cada vez mais, e o espaço ficou apertado.

Eu pude ver os olhos dos policiais, estavam todos em alertas e, quando o barulho aumentava, eles ficavam em posição de ataque. Eu senti muito medo, e quis sair correndo de lá. Um major da PM saiu dentre os escudos para tentar uma negociação. Ele propôs que alguns militantes fossem, numa outra ocasião, até uma secretaria, conversar com algum secretário (ele não foi muito claro). A tentativa de apaziguamento foi ignorada pelos militantes.

Com o passar do tempo o clima foi ficando mais tenso. Enquanto estávamos conversando com esse Major, um objeto, creio que seja uma lata ou garrafa, caiu no meio do batalhão. Ouvi um grito: “não! Não façam isso! Parem!.

Tarde de mais. Um jato caiu sobre nós e, em questões de segundos, a multidão começou a correr. Vi muitas pessoas agressivas ali na frente, senti que eles já queriam esse confronto. Ouvi muitos estouros, e bombas começaram a cair do meu lado. Eu já havia me perdido da equipe. Mas rapidamente encontrei o repórter. O cinegrafista e a estagiária haviam desaparecido entre a multidão em pânico.

Não tinha para onde correr. Muitas pessoas desmaiadas na rua. Algumas disputavam espaço numa única viatura do corpo de bombeiros que estava no local. Nós ficamos, inclusive, no lado dela para nos proteger. Mas as bombas caíam entre nós. E ficava cada vez mais difícil respirar.

Minha garganta, meu nariz e meus olhos queimavam muito. Até que eu não conseguia enxergar mais. O repórter, grande amigo, inclusive, me ajudou e tentou me proteger com o terno. Ele também estava na mesma situação, talvez pior.  As pessoas foram muito solidárias conosco. Ofereceram ajuda, água e vinagre. Os moradores também ofereciam ajuda. Principalmente a quem estava ferido.

Ficamos por um bom tempo no meio do conflito. Muitos jovens permaneceram ali arremessando objetos contra a polícia. A partir dai, a PM começou a atirar. Ouvíamos barulhos muito altos, de coisas quebrando. Mas não dava para enxergar.  Os repórteres insistiam em ficar ali na zona de confronto.

Encontramos nosso cinegrafista, que estava passando mal. Decidimos, então, sair dali e ir para um local seguro e longe das bombas. No caminho de volta, uma destruição sem precedentes. Muito lixo na rua, carros depredados e amassados. Caçambas de lixo jogadas no meio da avenida,  e portões sendo arremessados.

Algumas pessoas começaram a subir no muro  dos prédios para se proteger. Moradores gritavam pedindo para que a polícia parasse. Nos deparamos com mais pessoas solidárias, que perguntavam se estávamos bem.

Caminhamos até a praia. Lá, muitas pessoas passando mal, e outras muito nervosas. Ali, encontramos com outras equipes de imprensa, e ficamos sabendo que o carro de uma emissora havia sido totalmente quebrado, e a bolsa da repórter roubada.

Depois de um tempo, precisamos voltar para a área de conflito para fazer imagens. Encontramos mais destruição. Ficamos bem à frente, mas as bombas de efeito moral nos impediam de prosseguir. Era muito difícil respirar e enxergar. Além do nosso, outro cinegrafista estava nos acompanhando.

Recebemos a informação de que a polícia iria cercar os vândalos que ainda permaneciam em conflito com a polícia. Decidimos abandonar o local, por segurança. Entramos no carro de reportagem, mas, ficamos sabendo que o Secretário de segurança iria se pronunciar. O repórter foi até a Sesp conversar com ele e, enquanto isso fui entregar as fitas já gravadas para um repórter que estava na redação.

Na volta, recebemos a ordem de voltar para o protesto ou, então, ir até o Dpj de Vila Velha, pois uma equipe de reportagem que teve o carro quebrado estava lá. Decidimos ir à delegacia. Lá, recebemos a informação de que havia um manifestante detido. Esperamos ele chegar. O rapaz estava com uma garrafa com um pano dentro, e estava prestes  a atacar a polícia com aquela ‘arma’ – descobrimos que ele havia passagem pela polícia.

A delegacia foi meu último momento. Já me sentia exausto, pois estava desde 07h30 trabalhando. Decidi pegar um táxi, junto com uma amiga que nos acompanhava, pondo fim na segunda-feira atípica.


Participar da cobertura de uma manifestação é realizar um sonho antigo. Estou satisfeito como jornalista e cidadão.